sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Foi desejado... Por vezes é desejado...



Enterrem-me de preto


– Na noite escura,
chuvosa em uma rua
monstros em sintonia
despedaçam meu coração.

– Morro então,
feito um pobre cão
que viveu intensamente na solidão.

Morre então,
um filho amoroso
que de tanto carinho, tanto estima
não suportava mais viver.

Em sua casa avisam,
seus pais ficam depressivos
procurando uma forma de compreender.

A cidade mobilizada
surpreende-se, mas logo esquece
como se tudo, feito política tivesse
ocorrido por ocorrer.

– Aos amigos não há nada a dizer,
vícios compartilhados já não persistem,
apenas saudades tendem a enriquecer.

– Para o caminho da vida
aproximando-me estou,
deixando as mentiras caídas
como papéis pelo chão.





No quarto por sorte encontram,
seus pedidos de morte em um canto
como se tudo fosse para acontecer.

O garoto morto, de preto enterrado queria ser
sem tristeza ou alegria,
sem a ousadia de lágrimas sobre ele
derramar ao anoitecer.

Muitos ao funeral deslocavam-se
para ver o que policiais afirmavam ser
um rosto impossível de reconhecer.

Sua face, como seu coração, foi toda rasgada
servindo aos vermes como alimento,
no período que ficou suportando o sofrimento
de ninguém mais poder ver.

– Não se assustem com minha face
ou meus lábios deteriorados,
horrores melhores estão aprisionados.

A família inicia a despedida,
com o caixão parecendo flutuar
para o abismo dos imortais,
em que os sonhos jamais serão reais.

– Livre agora estou,
podendo na escuridão morar
com os amores que me restou.

(...)


Passam-se os dias
e sua mãe não consegue melhorar,
angustiada, tentando descobrir quem foi capaz
de seu filho poder roubar.

– Terei que para casa voltar
para a minha mãe informar
que a morte não é o que parece ser.

Retornando encontra a mãe desolada
e diz-lhe que os assassinos de sua criança tão amada
continuarão sempre a matar,
pois é difícil lutar contra quem tem a guerra a privar.

Sua mãe sonhando entendeu
e até seus últimos dias esperou,
mas seu filho jamais reencontrou.

Ao retornar, acabou por perder o caminho
e jamais a morte viva poder deliciar,
somente vagar pelos mundos
tentando morrer intensamente a gritar.

Não valorizou a vida oferecida pela morte
padecendo mais uma vez sem sorte
como um anjo que asas não pode ter.





Imagens ( respectivamente ):

La Persistencia del Pintor
Criação: Marti Carbonell
Técnica: Óleo sobre tela

Vida e morte
Criação: Gustav Klimt

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